Deputado vaza relatório sobre ação que acabou em 82 mortes na Ucrânia

Governo colocou atiradores ao redor da praça em protesto, diz documento.

Operação ‘Ola’ foi autorizada pelo presidente, que está foragido da justiça.

O regime do presidente ucraniano deposto Viktor Yanukovytch havia concebido uma operação “antiterrorista” para limpar o centro de Kiev, ocupado pelos manifestantes, que terminou em um banho de sangue, segundo documentos divulgados por um deputado.

No dia 18 de fevereiro no início da noite policiais equipados com megafones pediram que as mulheres e crianças presentes entre os milhares de manifestantes que ocupavam há três meses a Praça da Independência de Kiev (Maidan) deixassem o local. Falavam de uma “operação antiterrorista”. Trechos do documento que planeja esta operação, batizada de ‘Ola’, foram publicados na internet pelo deputado Guenadi Moskal.

Este deputado é o chefe do comitê parlamentar encarregado de investigar o banho de sangue que na semana passada acabou com 82 mortes, entre elas uma dezena de policiais, em confrontos entre manifestantes e forças de segurança, que dispararam com balas reais.

‘Trata-se de compreender a natureza e o alcance dos crimes cometidos pelo governo anterior e levar seus responsáveis perante a justiça’, explicou Guenadi Moskal, membro do partido da ex-primeira-ministra Yulia Tymoshenko, em seu site.

‘Estes documentos que detalham as atividades criminosas de autoridades das forças de segurança me foram enviados por membros patriotas do SBU (serviço de segurança ucraniano) e do ministério do Interior’, informou o deputado, que foi vice-ministro do Interior.

As revelações causaram uma forte agitação no Parlamento na terça-feira. Um dos responsáveis pelos protestos contra Yanukovytch considerou que a repressão pode ter deixado milhares de mortos.

Alguns documentos podem ser utilizados em procedimentos judiciais abertos contra o presidente deposto e contra responsáveis da administração.

A justiça ucraniana emitiu contra Yanukovytch uma ordem de detenção por assassinatos em massa e o Parlamento votou uma resolução que pede ao Tribunal Penal Internacional de Haia que o processe por crimes contra a humanidade.

Franco-atiradores
A operação ‘Ola’ previa, segundo os documentos, a mobilização em Kiev de 22 mil policiais e membros das forças especiais do ministério do Interior para neutralizar os membros de um grupo nacionalista paramilitar presente entre os manifestantes, Pravy Sector (Setor Direito), acusado de preparar atentados.

Mas se tratava, sobretudo, de fazer com que os milhares de manifestantes que acampavam na praça há meses caíssem em uma armadilha e de limpar a Maidan, esvaziando o local.

Muitas medidas contempladas no plano foram aplicadas, ao menos temporariamente, no dia 18 de fevereiro: o bloqueio das estradas que levam a Kiev, o fechamento do metrô, o corte das transmissões das redes de televisão que apoiam a oposição, sobretudo o Kanal 5, e a mobilização de franco-atiradores ao redor da Praça da Independência.

Os franco-atiradores são acusados de ter matado vários manifestantes na quinta-feira, dia 20 de janeiro, abrindo fogo contra os que acabavam de se lançar contra um cordão de policiais antidistúrbios. As imagens de vídeo confirmam.

O plano também previa um ataque à Casa dos Sindicatos, que servia de quartel-general aos diferentes movimentos opositores, assim como de refeitório e de centro médico. Um incêndio foi declarado no edifício durante o ataque e o local ardeu durante horas.

‘Agora sabemos por que a Casa dos Sindicatos pegou fogo’, comentaram nesta terça-feira os deputados. Um conselheiro oficial, ex-diretor dos serviços de inteligência militar russos, havia participado do planejamento da operação.

Um capítulo dedicado às deficiências do plano se pergunta se teriam veículos suficientes para transportar os manifestantes detidos e sugere como local de detenção a fábrica do Arsenal, famosa por seu motim bolchevique em 1918. Também sugere pedir ao ministério do Interior russo bombas de efeito moral. A repressão sangrenta levou no sábado à destituição de Yanukovytch e à chegada da oposição a cargos chave.

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