Petrobras contratou Alstom mesmo com alertas sobre risco de prejuízo
Estatal comprou turbinas de empresa suspeita de formar cartel em SP.
Negócios ocorreram nos governos de Fernando Henrique, Lula e Dilma.
Documentos obtidos pelo Jornal Nacional revelam que a Petrobras contratou a Alstom, empresa suspeita de formar cartel em licitações do Metrô de São Paulo, mesmo com alertas do departamento jurídico, que via risco de prejuízo nos negócios. Os contratos para fornecimento e manutenção de turbinas de termelétricas foram firmados nos governos de Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, e de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, do PT.
Para um firmar contrato de 2001, a Petrobras enviou funcionários à Suíça para tratar pessoalmente com a Alstom, numa viagem que custou R$ 44.177,09. O objetivo era comprar turbinas para a termelétrica de Nova Piratininga (SP), que usava óleo pesado como combustível e passaria a ser movida a gás, fonte mais barata de energia.
A compra, realizada durante o governo FHC, custou US$ 49,7 milhões, dentro do programa emergencial de termelétricas, porque a oferta de energia estava escassa. Na época, os advogados da estatal listaram 22 problemas nos termos do contrato que poderiam causar prejuízos.
Uma das cláusulas dizia que em caso de defeitos nas turbinas, “o único remédio possível” seria receber até 15% do valor, e não o valor integral da peça. A mesma regra deixava a critério da Alstom a alteração de garantias de desempenho, possibilidade que o departamento jurídico sugeriu suprimir do contrato.
“É de se notar que, caso haja atraso nas atividades de comissionamento por culpa do vendedor, não existe nenhum tipo de penalidade acordada neste instrumento, considerando-se […] os prejuízos que poderão advir”, diz trecho do parecer.
O resumo executivo, que orientou a compra, foi assinado por Delcídio do Amaral, na época diretor da área de Gás e Energia da Petrobras, e hoje senador pelo PT-MS. Ele autorizava o então gerente executivo de Energia, Nestor Cerveró, a assinar os instrumentos contratuais em nome da Petrobras.
Um ano antes, em 2000, a Alstom já havia deixado de honrar 35 dos 61 contratos de fornecimento de turbinas para termelétricas da Petrobras. Os equipamentos apresentaram defeito e, conforme documentos internos da estatal, isso gerou grande impacto, seja em atrasos ou em despesas.
Contratos encerrados
Procurada, a Petrobras declarou que os alertas do setor jurídico não foram considerados pertinentes pela área técnica especializada em turbogeradores. Disse também que a cláusula que garante à Alstom a revisão unilateral de garantias é comum para equipamentos do tipo.
Segundo a estatal, o contrato de Piratininga foi encerrado e não existem novos contratos com a Alstom para a compra de turbinas.
A Alstom manifestou repúdio às insinuações de irregularidades e afirmou que entregou o que estava previsto em contrato.
Delcídio disse que o contrato assinado segue o padrão de garantia de assistência técnica e manutenção aceito por todos os compradores e que não suscitava riscos. Segundo o senador, independentemente de governos, a Petrobras sempre preservou a legalidade dos contratos.
Em nota, Nestor cerveró disse que as decisões tomadas foram aprovadas pela diretoria, e não pela gerência.
Governos Lula e Dilma
Embora tenham começado no governo do PSDB, os negócios entre Petrobras e a Alstom continuaram na gestão de Lula, do PT. Boa parte dos contratos de energia com empresa suíça foi feita sem licitação, direto com o fornecedor, conforme documentos da Petrobras.
Em 2007, o departamento jurídico afirmou em comunicado interno que a Petrobras havia feito pagamentos para os quais não havia contrapartida em fornecimento efetivo e estava impossibilitada de fechar novos contratos com a Alstom até julho daquele ano.
No ano passado, já durante o governo Dilma, a Alstom anunciou a renovação de contrato para manutenção de turbinas em várias termelétricas da Petrobras.