Escutas indicam que fiscais também fraudaram o IPTU em São Paulo
Gravações envolvem novamente o nome do secretário Antonio Donato.
Promotores suspeitam que Secovi alertou fiscais sobre investigação.
Novas escutas da investigação sobre o grupo de funcionários da Prefeitura de São Paulo suspeito de fraudar o Imposto sobre Serviços (ISS) indicam que eles também cometeram irregularidades em relação à cobranças do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). Nas gravações reveladas pela edição do Fantástico deste domingo (10), os auditores Carlos Augusto Di Lallo Amaral e Luís Alexandre Magalhães falam sobre fraude e sobre a investigação feita pela Ministério Público de São Paulo e pela Controladoria Geral da prefeitura.
“O IPTU não pegaram”, afirmou Di Lallo. Luís Alexandre, que na conversa se mostrava nervoso por uma suposta traição dentro da quadrilha, respondeu que denunciaria o esquema. “Eu faço pegar. A gente fez um monte de coisa no IPTU”, disse. Na sexta-feira (8), o prefeito Fernando Haddad (PT) afirmou que membros da quadrilha também fraudaram o IPTU fazendo mudanças cadastrais.
A escuta mostra que a cobrança de propina não começou em 2006, como indicavam as investigações. Luís Alexandre afirmou ter relatórios desde 2002. A investigação culminou com a prisão de quatro auditores no dia 30 de outubro. Eles já deixaram a prisão temporária, e serão denunciados à Justiça pela prática de diversos crimes, segundo o Ministério Público.
Secovi
Os promotores que investigam o caso passaram a desconfiar que o Secovi, o Sindicato da Habitação, que representa empresas do ramo imobiliário, estava dando alertas para os fiscais. O Secovi tinha sido procurado para ajudar nas investigações. A suspeita é baseada em um diálogo entre Ronilson e Eduardo Barcellos, outro dos auditores suspeitos de participar do esquema.
Na conversa, Barcellos diz a Ronilson que o Secovi promete não contar nada à Justiça se os auditores também ficarem de boca fechada. Barcellos repete o que o representante do Secovi teria dito: “Teve uma reunião assim, assim, assim, assado. Da nossa parte eu não sei de nada. Eu queria garantia da parte de vocês, que não sai nada de lá também”, disse.
Em nota ao Fantástico, o Secovi afirmou que não teve qualquer contato com o Eduardo Barcellos, e não mandou ninguém para falar em nome da entidade. O sindicato diz ainda que aguarda a conclusão das investigações para apurar a responsabilidade criminosa de quem falou em nome do Secovi sem autorização. Também afirma que se colocou à disposição para auxiliar nas investigações.
Arquivamento
Ronilson Bezerra Rodrigues disse a outro fiscal que o ex-prefeito Gilberto Kassabx (PSD) determinou o arquivamento de investigação preliminar contra ele, de acordo com gravação revelada pela edição do jornal Folha de S.Paulo e obtida pelo Jornal Hoje. Ronilson, solto na madrugada deste sábado (9) com outros dois auditores, é apontado como líder de suposto esquema de fraude do ISS que pode ter desviado cerca de R$ 500 milhões.
Em 2012, o auditor foi investigado administrativamente por patrimônio incompatível com sua renda. A gravação mostra Ronilson dizendo ao auditor fiscal Luís Alexandre Magalhães, também preso na operação e liberado antes após delação premiada, como Kassab pôs fim à apuração.
Ronilson: “Vou dizer o que o corregedor [ da gestão Kassab, Edilson Bonfim] fez comigo. Ele pegou a declaração de bens da prefeitura, com a evolução patrimonial, foi no Kassab. Isso o João Francisco Aprá, chefe-de-gabinete do Kassab, me contando. Ele falou: ‘olha, a evolução é compatível, mas eu queria abrir a conta dele’. E o Kassab: não, não tem motivo’. E falou: ‘então arquiva’. Arquivou. Mas eu fui no corregedor”, diz áudio.
A assessoria de Kassab enviou uma nota em nome do ex-prefeito e de João Francisco Aprá dizendo disse que as afirmações são “falsas e mentirosas”. O ex-prefeito repudiou tentativa de envolver seu nome em irregularidades e disse ainda que as investigações começaram em setembro de 2012 e que só não terminaram porque a gestão chegou ao fim e que a apuração foi transferida para a nova administração.
O ex-corregedor Edilson Bonfim afirmou que quem arquivou a investigação aberta pelo ex-secretário de Finanças foi o atual controlador-geral do município, Mário Spinelli. Bonfim afirmou ainda que o processo aberto por ele continua aberto e que a conversa citada por Ronilson é uma infâmia. Mário Spinelli disse que a investigação não chegou a virar um processo e que, por isso, sequer foi arquivada. Spinelli diz que arquivou uma segunda investigação até que surgissem fatos novos. Um mês depois, com base em levantamento patrimonial, abriu novo inquérito.
‘Tinha ciência’
Na quinta-feira (7), áudio divulgado pelo Jornal Nacional mostra outro telefonema de Ronilson dizendo que o secretário e o prefeito com quem trabalhou, Gilberto Kassab, “tinham ciência de tudo”.
Em telefonema gravado no dia 18 de setembro, com autorização da Justiça, Ronilson reclama, com outra fiscal, que saiu no Diário Oficial que ele está sendo investigado, dentro da Prefeitura.
“É um absurdo. Paula, tinha que chamar o secretário e o prefeito também, você não acha? Chama o secretário e o prefeito que eu trabalhei. Eles tinham ciência de tudo”, afirma Ronilson, que acusado pelo Ministério Público de comandar o esquema de corrupção que pode ter desviado até R$ 500 milhões da Prefeitura de São Paulo.
A investigação já descobriu muitos depósitos na boca do caixa em conta pessoal do ex-subsecretário da receita da gestão Gilberto Kassab, eleito pelo DEM e hoje no PSD.
Com dinheiro da propina, Ronilson Bezerra Rodrigues teria comprado pelo menos 11 apartamentos e escritórios em São Paulo, Minas e Rio, além de cabeças de gado para uma fazenda em Minas. Até agora, os promotores não encontraram nenhuma prova de que Kassab soubesse da corrupção.
O advogado de Ronilson, Márcio Sayeg, afirma que seu cliente é inocente.
Entenda como funcionava a fraude
Segundo a investigação da Controladoria Geral do Município (CGM) e do Ministério Público (MP), um grupo de auditores e fiscais fraudava o recolhimento do ISS. Ele é calculado sobre o custo total da obra e é condição para que o empreendedor imobiliário obtenha o “Habite-se”.
O foco do desvio na arrecadação de tributos eram prédios residenciais e comerciais de alto padrão, com custo de construção superior a R$ 50 milhões. Toda a operação, segundo o MP, era comandada por servidores ligados à subsecretaria da Receita, da Secretaria de Finanças.
Do G1