ONU pede que Vaticano entregue às autoridades envolvidos em abusos

Relatório faz duras críticas ao modo como Santa Sé lidou com pedofilia.

Comitê também quer que a Igreja abra arquivos sobre abusos do clero.

A Organização das Nações Unidas (ONU) pediu nesta quarta-feira (5) que o Vaticano “afaste imediatamente” de seus cargos todos os clérigos responsáveis ou suspeitos de abuso de crianças, e os denuncie às autoridades civis, em um relatório sem precedentes feito sobre pedofilia na Igreja Católica.
O Comitê da ONU para os Direitos da Infância (CRC, na sigla em inglês) disse que a Santa Sé também deve entregar seus arquivos sobre abusos sexuais a dezenas de milhares de crianças para que os culpados e as pessoas ligadas aos crimes possam ser responsabilizados.

“O comitê está gravemente preocupado pelo fato de que a Santa Sé não percebeu a extensão dos crimes cometidos, não tomou as medidas necessárias para lidar com casos de abuso sexual infantil nem para proteger essas crianças, e adotou políticas e práticas que levaram à continuidade dos abusos e à impunidade dos perpetradores [criminosos]”, diz o documento.

O Vaticano disse nesta quarta que enfrenta os casos de pedofilia na Igreja Católica com uma “exigência de transparência”, e a prova disso é que, nos próximos dias ou semanas, irá explicar o funcionamento da comissão criada para preveni-los.

O comitê da ONU acrescentou que a Igreja Católica ainda não tomou as medidas para evitar a repetição de casos como o escândalo das lavanderias da Irlanda, em que meninas foram colocadas arbitrariamente em condições de trabalho forçado, entre 1922 e 1996.

O órgão pediu uma investigação interna sobre o caso e situações semelhantes, para que os responsáveis possam ser processados e uma “compensação total” seja paga às vítimas e às suas famílias.

Uma comissão criada em dezembro de 2013 pelo Papa Francisco deveria investigar todos os casos de abuso sexual infantil, “assim como a conduta da hierarquia católica ao lidar com eles”, aponta o texto da ONU.

Nos últimos anos, integrantes do clero envolvidos em abuso foram transferidos de paróquia a paróquia em seus países, “em uma tentativa de acobertar tais crimes”, acrescenta o relatório.

“A prática da mobilidade dos criminosos, que tem permitido a muitos sacerdotes permanecer em contato com crianças e seguir abusando delas, continua expondo menores de muitos países a um alto risco de sofrer abusos sexuais”, afirma o relatório.
“Devido ao código de silêncio imposto a todos os membros do clero, sob pena de excomunhão [expulsão da Igreja], casos de abuso sexual infantil dificilmente foram relatados às autoridades policiais nos países onde tais crimes ocorreram”, diz o documento.

O Vaticano viola a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança ao não fazer o suficiente para erradicar os casos de pedofilia na Igreja, afirmou também nesta quarta a presidente do comitê.

“A resposta é sim, até agora tem violado a Convenção, porque não tem feito tudo o que deveriam para acabar com este problema”, disse Kirsten Sandberg.

Sessão pública
Em uma sessão pública realizada no mês passado em Genebra, na Suíça, o comitê da ONU pressionou representantes do Vaticano a revelar o alcance dos casos de pedofilia nas últimas décadas dentro da Igreja.

Na ocasião, a delegação da Santa Sé respondeu a perguntas de 18 integrantes de diversas nacionalidades – pela primeira vez desde que o escândalo surgiu, há mais de duas décadas – e negou as acusações de que o Vaticano tenha acobertado os casos. Além disso, declarou que foram criadas diretrizes claras para proteger as crianças.

O Papa Francisco afirmou, à época, que os casos são motivo de “vergonha” para a Igreja.

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