Brasil recebe menos estrangeiros que Catalunha, México e Vietnã
Marca de 6 mi de turistas em 2013 é modesta comparada a outros países.
Veja alguns fatores que dificultam a vinda de visitantes internacionais.
O Brasil registrou nesta quinta-feira (5) a chegada do turista estrangeiro número 6 milhões em 2013. O dado é um recorde histórico e foi celebrado pelo governo com festa para uma visitante argentina que chegou ao Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro, e foi escolhida para representar a marca.
Uma avaliação do cenário mundial, porém, revela que o Brasil está muito atrás de outros destinos na atração de turistas internacionais.
Até outubro deste ano, por exemplo, apenas a Catalunha (região da Espanha onde fica a cidade de Barcelona) havia recebido mais do que o dobro de visitantes internacionais do que todo o Brasil: 14 milhões.
A cidade de Londres sozinha também recebeu, nos seis primeiros meses de 2013, mais turistas estrangeiros do que o Brasil no acumulado do ano: foram 7,9 milhões de pessoas.
“Considerando o tamanho e os recursos do Brasil, o número [de 6 milhões] é bastante baixo”, disse ao G1 John Kester, responsável pela área de tendências do turismo e estratégias de marketing da Organização Mundial do Turismo (OMT). “O turismo interno ainda é muito importante no país. A abertura para o turismo internacional está apenas começando”, completa.
Dados da OMT mostram que, em 2012, o Brasil foi o 45º lugar no ranking dos países que mais receberam turistas internacionais, com 5,7 milhões de visitantes. Países como Malásia, Áustria, Cingapura, Marrocos, Vietnã e Tunísia ficaram mais bem colocados. A França, primeiro lugar da lista, recebeu 83 milhões de pessoas.
Entre os países emergentes do Brics, o Brasil foi o último. A China ficou em terceiro lugar, com 57,7 milhões; a Rússia, em nono, com 25,7 milhões; a África do Sul, em 29° lugar, com 9,2 milhões; e a Índia, em 41°, com 6,6 milhões.
Na América Latina, o primeiro lugar foi o México, com 23,4 milhões de visitantes internacionais. A Argentina veio logo depois do Brasil, com 5,6 milhões.
Segundo especialistas, são vários os fatores responsáveis pela má posição do Brasil no ranking. Entre eles, preços altos e baixa competitividade em relação a outros destinos, malha aérea insuficiente, pouca divulgação do destino por parte do governo e de entidades privadas, e a localização do país. Veja alguns deles a seguir.
Localização geográfica
Para Kester, da OMT, o fato de o Brasil estar distante dos países que são os principais emissores de turistas internacionais, como EUA, China e Rússia, é um entrave. Comparados a eles, os países mais próximos do Brasil, como Argentina, Chile, Uruguai, ainda são um mercado pequeno.
O México, por exemplo, beneficia-se da proximidade com os Estados Unidos – 80% de seus visitantes estrangeiros vêm de lá, segundo Flávio Dino, presidente da Embratur (órgão do Ministério do Turismo responsável pela promoção do Brasil no exterior).
Dino ressalta que globalmente, o turismo internacional é principalmente de fronteira. Segundo ele, 85% dos turistas que circulam pela Europa, por exemplo, vêm de países de dentro do continente. No Brasil, apesar de os argentinos serem maioria entre os turistas estrangeiros, o turismo intrarregional não está consolidado, acrescenta Dino.
Malha aérea deficiente
A dimensão continental do Brasil, somada à falta de transporte ferroviário na América do Sul e à existência de barreiras geográficas como a Cordilheira dos Andes e a Amazônia, dificulta o transporte por terra e exige o uso de avião mesmo para turistas de países fronteiriços. E então a pouca oferta de voos internacionais diretos atrapalha.
Para Débora Cordeiro Braga, professora do curso de turismo da USP (Universidade de São Paulo), forma-se um círculo vicioso, já que as companhias internacionais acabam não abrindo novas rotas porque não têm a garantia de que haverá turistas para preenchê-las, e os turistas continua não vindo devido à falta de voos.
Dino, da Embratur, reconhece que essa é uma dificuldade, especialmente no caso de voos internacionais com destino a aeroportos fora do Rio e de São Paulo. “Quem quiser ir de Lima a Brasília, por exemplo, tem que fazer escala. É um voo que seria curto e fica longo”, diz.
Ele afirma, porém, que o cenário está melhorando, e cita como exemplo a implantação da primeira ligação direta entre a Europa e a Amazônia, prevista para o ano que vem. A rota é da empresa portuguesa TAP e irá de Lisboa a Manaus.
Falta de competitividade e de infraestrutura
É comum que turistas estrangeiros e brasileiros reclamem que o preço de viajar pelo Brasil pode ser mais alto do que o de ir para destinos internacionais como os EUA e o Caribe.
No Relatório de Competitividade em Viagem e Turismo de 2013, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil aparece na 51ª posição entre 140 países. No quesito de competitividade de preços, desce para o 126º lugar. Hotéis do Rio de Janeiro frequentemente aparecem nas listas dos mais caros do mundo, por exemplo.
Para a Embratur, esse é o principal entrave ao crescimento do número de turistas estrangeiros. Empresários reclamam do alto custo de manter um negócio no Brasil. O governo afirma que reduziu tributos para a hotelaria nacional e que isso deve contribuir para reduzir os preços.
Flávio Dino acredita também que com o aumento da oferta de serviços turísticos com a Copa, deve haver maior equilíbrio e menos preços abusivos nos setores de aviação e hospedagem.
Kester, da OMT, afirma que há muito a ser feito, e o país tem que aproveitar os grandes eventos esportivos para priorizar investimentos em aeroportos, hospedagem e transporte rodoviário.
Falta de divulgação do Brasil no exterior
Para a professora Débora Cordeiro, a divulgação do Brasil no exterior é falha, e deve ser feita não apenas por meio de campanhas publicitárias, mas também juntos aos operadores internacionais, para que isso se ramifique e as agências nos outros países ofereçam o Brasil como opção. “Precisa ter conexão com as operadoras para oferecerem mais o Brasil”, diz.
O presidente da Embratur afirma que o órgão promove o Brasil constantemente em ações para operadores de turismo e jornalistas internacionais — em 2012, foi realizada uma ação por dia, diz Dino. Ele afirma ainda que no mês passado foram implantados 13 escritórios de promoção turística do Brasil no exterior.
Mas Dino reclama do orçamento do governo para a promoção internacional – que foi de R$ 140 milhões neste ano e deve se manter nesse patamar no ano que vem. “Não temos dinheiro para fazer publicidade lá fora como deveríamos. Faremos agora uma campanha internacional. Poderíamos fazer em 20 países, mas escolhemos sete”, afirma.
John Kester, da OMT, diz que o Brasil precisa aproveitar a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 para criar uma imagem internacional positiva. “Tem que dizer ao mundo: ‘aqui estamos’. É necessário investir nas mudanças necessárias, como aeroportos, alojamento e infraestrutura, mas é importante aproveitar que o mundo todo estará de olho no país para falar das coisas boas.”
Segundo Kester, somente essa imagem positiva é capaz de gerar a motivação necessária para que os turistas venham ao país apesar dos problemas, como preço alto ou altos índices de violência. “Paris é cara, mas se você quer ver a Torre Eiffel tem que ir para lá, não há outra forma. Cada país tem que encontrar sua vantagem natural. Se você não projeta muitas imagens positivas, o que pesam são as negativas”, diz.
Ele ressalta também a importância de capacitar os profissionais que lidam com os estrangeiros, inclusive com o maior domínio de idiomas. No Brasil, pesquisas mostram que uma das principais queixas dos estrangeiros é a dificuldade para se comunicar devido ao pouco domínio de inglês pela população.
Em 2014, com a realização da Copa do Mundo de Futebol no Brasil, o governo quer chegar aos 7 milhões de turistas. Para 2020, a meta é atingir os 10 milhões.
Débora Cordeiro, da USP, considera que, ainda que a meta do governo não seja atingida, deve haver um crescimento maior do que o que vinha ocorrendo porque muita gente que não sabe nada sobre o Brasil passará a conhecer o país. “É possível, dependendo do resultado da Copa – se conseguirmos receber adequadamente os turistas e se os problemas de infraestrutura não atrapalharem”, avalia.
Do G1