Decreto imperial dizia que “matemática era um conhecimento restrito aos homens”
Por André Luis, com informações de Edison Veiga / BBC News Brasil
Nesta segunda-feira, 15 de outubro, dia em que se comemora o “Dia dos Professores”, uma matéria do jornalista, Edison Veiga, para a BBC News Brasil, levantou alguns pontos históricos e curiosos com relação ao início da educação pública no País.
Segundo a historiadora e professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, Katia Abud, para Veiga, “o 15 de outubro faz alusão à criação das classes de primeiras letras no Brasil”, mas as comemorações só tiveram início no século 20.
Segundo o autor, a data foi sugerida por conta do decreto imperial de 1827, onde em 17 artigos, o imperador Dom Pedro I mandou “criar escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos do Império”.
Ainda segundo Veiga, a ideia foi de um grupo de professores do Ginásio Caetano de Campos – apelidado de Caetaninho, já que desde 1894 existia a Escola Caetano de Campos, Em São Paulo, na época ainda no endereço da Praça da República. “Ali, um grupo de professores teve a ideia de interromper o ano letivo com um dia de folga. E uma pequena comemoração, em que houvesse o reconhecimento pelo trabalho realizado”, afirma Veiga.
Veiga também escreve que, “aos poucos, a ideia pegou. Outras escolas começaram a fazer o mesmo. Até que, em 14 de outubro de 1963, o então presidente João Goulart assinou o decreto nº 52.682 e criou o feriado escolar do Dia do Professor no Brasil”.
Segundo o historiador e pesquisador do Centro Salesiano de Pesquisas Regionais, Diego Amaro de Almeida, “a lei foi uma tentativa de organizar a educação no Brasil”
“Dom Pedro, por graça de Deus, e unânime aclamação dos povos, imperador constitucional e defensor perpétuo do Brasil”, conforme relata o documento, decreto que “em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos haverão as escolas de primeiras letras que forem necessárias”.
Um dos pontos que chama a atenção na lei imperial, previa a criação de “escolas de meninas”, mas apenas nas “cidades e vilas mais populosas, em que (…) julgarem necessário esse estabelecimento”.
Almeida relata que, “muitos pais preferiam preceptoras quando se tratavam das meninas.” Ele cita, por exemplo o caso do Visconde de Guaratinguetá que, em 1865, contratou uma francesa para ensinar sua filha em casa. “E, mesmo assim, a contragosto porque, para ele, ‘instrução de meninas é o casamento'”, cita o pesquisador.
Rezzutti lembra que, apesar de previstas em lei, acabaram sendo raríssimas as escolas para meninas. “Até porque, segundo o pensamento da época, meninas não raciocinavam tão bem quanto os meninos”, explica. “Por isso, aliás, as operações matemáticas para elas não eram matéria obrigatória.”
Veiga ainda menciona dois artigos da lei imperial que tratavam sobre a mulher professora, segundo levantamento do autor, os artigos décimo-segundo e o décimo-terceiro, mostra que curiosamente, elas nunca são chamadas de professoras – mas, sim, de “mestras”, termo que aparece apenas uma vez no masculino, em uma frase que se contrapõe às mestras.
O artigo décimo-segundo diz que cabia a elas o ensino de quaisquer disciplinas estipuladas no artigo sexto, “com exclusão das noções de geometria e limitando a instrução da aritmética só as suas quatro operações”. “Havia uma mentalidade, corroborada pelo próprio imperador, de que a matemática era um conhecimento restrito aos homens”, conta Martins.
Ainda segundo levantamento de Veiga, o texto também previa que elas ensinassem “as prendas que servem à economia doméstica”. E fazia uma ressalva moral: as professoras precisavam, além de serem brasileiras, terem “reconhecida honestidade”.
“Honestidade, no caso, era o comportamento moral”, explica Almeida. “Durante muito tempo as mulheres, para serem admitidas na carreira, precisaram se sujeitar a muitas regras de conduta. Havia o entendimento que a profissão de professora era muito próxima da maternidade.”
O autor destaca que, se alguns desses pontos ferem qualquer princípio de direitos iguais independentemente de gênero, o item seguinte é um alento. Em pleno ano de 1827, a lei imperial cravava que “as mulheres vencerão os mesmos ordenados e gratificações concedidas aos mestres”.
“Essa postura é interessantíssima”, comenta Almeida. “Igualdade de condições com os homens.”
O texto original do jornalista Edison Veiga pode ser acessado clicando aqui.