Dom Saburido envia a Roma pedido de canonização de Dom Hélder
Anúncio foi feito na manhã desta terça-feira (27).
Dom Hélder foi um dos mais influentes religiosos no Brasil do século 20.
O arcebispo de Olinda e Recife, Dom Fernando Saburido, anunciou nesta terça-feira (27) que que vai solicitar a Roma o inicio do processo de canonização de Dom Helder Câmara, arcebispo emérito de Olinda e Recife, falecido em 1999. Nesta terça, foi assinada uma carta dirigida à Congregação Para Causa dos Santos, em Roma, pedindo licença para iniciar o processo de canonização.
A carta enviada tem uma breve explicação da causa, expondo dados biográficos de Dom Hélder. Com chegada das respostas positivas do Vaticano, o arcebispo pode abrir o processo e anuncia a instalação do tribunal eclesiástico. Uma comissão histórica deve ser formada, para que profissionais pesquisem e colham escritos de Dom Hélder, assim como documentos que dizem respeito à causa, incluindo os da Comissão da Verdade. Pelo menos três teólogos vão analisar os escritos de Dom Hélder para dar um parecer de que os escritos estão de acordo com as normas da Igreja Católica.
Saburido explicou que só pode mandar a carta depois que recebeu o aval da Confederação de Bispos do Brasil no Nordeste (CNBB).
Processo
Na primeira etapa da canonização, o postulante precisa ser reconhecido Servo do Senhor. Após examinar o relatório, a Santa Sé tem que emitir o decreto “Nihil Obstat”. Assim é iniciado oficialmente o processo, e o postulante é nomeado Servo do Senhor. A etapa seguinte consiste em reconhecer suas “virtudes heroicas”.
Para isto, uma comissão jurídica do Vaticano se reúne para estudar os textos que publicaram em vida e analisar os testemunhos de pessoas que os conheceram. Em seguida, o relator do processo, nomeado pela Congregação para a Causa dos Santos, elabora um documento denominado “Positio”.
Um compêndio dos relatos e estudos realizados pela comissão, assim que aprovado pelo pontífice, concede o título de Venerável Servo do Senhor, o segundo passo em direção à santidade. O passo seguinte é o da beatificação.
Ser beato, ou bem-aventurado, significa representar um modelo de vida para a comunidade e, além disso, que essa pessoa tem a capacidade de agir como intermediário entre os cristãos e Deus. Depois disso, ainda é preciso passar por mais uma fase.
Trata-se da canonização, sua proclamação como santos, para a qual é requisito imprescindível um novo milagre, que deve ocorrer após sua nomeação como beatos. A decisão do Papa de canonizar João XXIII sem registro de milagre, algo não muito frequente nas últimas décadas, é uma prerrogativa do chefe da Igreja, segundo as normas do Vaticano.
Perfil
Cearense de nascença, Dom Hélder Câmara foi um dos mais influentes personagens da Igreja Católica no Brasil do século 20, principalmente quando comandou a Arquidiocese de Olinda e Recife, durante o período da Ditadura Militar. Dom Hélder Câmara nasceu em 7 de fevereiro de 1909, em Fortaleza, e teve 12 irmãos, dos quais cinco morreram em 29 dias, em consequência de uma epidemia de difteria. Após entrar muito jovem no Seminário da capital do Ceará, se tornou padre aos 22 anos.
O primeiro momento da vida religiosa de Dom Helder foi marcado pela militância junto a instituições políticas conservadores, como a Ação Integralista Brasileira (espécie de fascismo no País), entre 1932 e 1937.
Mais tarde, o religioso considerou a participação como um erro da juventude.
Já radicado no Rio de Janeiro desde 1936, passou a optar por um trabalho assistencialista, quando fundou departamentos da Igreja voltados para atender os mais necessitados.
Após longo período atuando na então capital do Brasil, Dom Hélder foi nomeado para o Maranhão por apresentar divergências com o arcebispo carioca Dom Jaime Câmara. Com a morte do arcebispo de Olinda e Recife, é mandado para Pernambuco, onde desembarcou em 12 de abril de 1964, poucos dias após o golpe militar.
Na capital pernambucana, o religioso desembarcou em meio a uma relação conturbada entre Governo do Estado e Igreja. Apesar do clima, Dom Hélder recepcionado com festa pelas autoridades do Estado, em ato na Praça da Independência, no centro do Recife. Dois dias após a posse, Dom Hélder lançaria, juntamente com outros 17 bispos nordestinos, um manifesto à Nação, pedindo liberdade das pessoas e da Igreja. O primeiro grande atrito, entretanto, ocorreu em agosto de 1969, quando o arcebispo foi acusado de demagogo e comunista, por ter criticado a situação de miséria dos agricultores do Nordeste.
A partir de então, Dom Hélder sofreu represálias, inclusive com sua casa metralhada, assessores presos e com a morte de Padre Antônio Henrique, que foi assassinado. Em 1970, quando Dom Hélder teve o nome lembrado para o Prêmio Nobel da Paz, o governo brasileiro promoveu uma campanha internacional para derrubar a indicação, já que ele denunciava a prática de tortura a presos políticos no Brasil. Também em 1970, os militares chegaram a proibir a imprensa de mencionar o nome do Arcebispo de Recife e Olinda.
Dom Hélder ficou na Arquidiocese de Olinda e Recife até sua aposentadoria, no dia 10 de abril de 1985, quando foi substituído pelo arcebispo Dom José Cardoso Sobrinho. Ele morreu em sua casa, no Recife, em 27 de agosto de 1999, devido a uma insuficiência respiratória decorrente de uma pneumonia.
Uma multidão acompanhou o seu corpo que foi conduzido até a Igreja da Sé, em Olinda, onde foi sepultado.
Pelo seu trabalho em defesa dos direitos humanos, Dom Hélder recebeu vários prêmios internacionais, como Martin Luther King, nos Estados Unidos, 1970, e o Prêmio Popular da Paz, na Noruega, 1974. O religioso é autor de 22 livros, a maioria ensaios e reflexões sobre o terceiro mundo e a igreja.