Liminar da Justiça Federal suspende demolição de galpões no José Estelita

Documento é assinado pelo juiz Francisco Barros, da 21ª Vara Federal.
Consórcio Novo Recife ainda não informou se vai recorrer da decisão.

A Justiça Federal em Pernambuco concedeu, na tarde desta quinta-feira (22), liminar que proíbe a derrubada dos galpões do Cais José Estelita, iniciada na noite de quarta-feira (21) pelo Consórcio Novo Recife. A decisão do juiz Francisco Antônio Barros e Silva Neto, titular da 21ª Vara Federal, também pede a suspensão de eventual construção na área. O magistrado atendeu a um pedido feito pelas procuradoras da República Carolina de Gusmão Furtado e Mona Lisa Ismail, do Ministério Público Federal (MPF) em Pernambuco.

Ao G1, a procuradora da República Carolina de Gusmão Furtado afirmou que o magistrado suspendeu a demolição e qualquer tipo de construção até que a ré – empresa Novo Recife – comprove no processo a aprovação do projeto com a autorização de órgãos municipais e federais, como Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), exibindo a competente licença de demolição/construção. “O processo está na 12ª Vara Federal, mas a juíza declarou impedimento de atuar no caso. O substituto natural é o juiz Francisco Barros, titular da 21ª Vara, que concedeu essa liminar”, explicou a integrante da Procuradoria Regional da República da 5ª Região (PRR5).

Na decisão, o juiz também intimou a Prefeitura do Recife a vistoriar o imóvel, em até 48 horas. “Intime-se, igualmente com urgência, o Município do Recife/PE, a fim de que, no prazo de quarenta e oito horas, vistorie o imóvel, de modo a confirmar se houve ou não a demolição noticiada pela imprensa e, conforme o caso, esclarecer se houve a aprovação do projeto”.

Antes da divulgação da decisão judicial, o Iphan já havia embargado, administrativamente, a demolição dos armazéns. “Há patrimônio nacional histórico no terreno e, para haver demolição, precisa autorização do Iphan, que não há. O entendimento do Ministério Público de Pernambuco [MPPE] também é que a área ainda está no perímetro do patrimônio histórico e não pode ser demolida”, disse o promotor de Meio Ambiente, Ricardo Coelho, que acompanha o caso. Em nota, o grupo de construtoras que forma o Consórcio informou que a notificação de embargo emitida pelo Iphan está sendo tratada no âmbito jurídico.

Pedido de reintegração de posse
Um grupo que protesta contra o projeto vai passar a noite acampado no terreno. A negociação foi acertada entre um dos representantes do consórcio, Eduardo Moura, e uma das integrantes do grupo Direitos Urbanos, Liana Cirne.

O acordo ainda permite a entrada e saída dos manifestantes por uma entrada lateral ao Cais, próxima a um viaduto que vem do Pina. A pedido de membros do Ministério Público Estadual, policiais militares vão ficar no local para garantir a segurança desse grupo. Em nota, o Consório Novo Recife informou que entrou com pedido de reintegração de posse do terreno.

Nesta sexta-feira (23), uma comissão de cinco manifestantes será recebida na sede do MPPE, na Avenida Visconde de Suassuna, Centro da capital, para uma reunião com os promotores Ricardo Coelho e Maxwell Vignoli. Representantes da Prefeitura, do Iphan e do Consórcio Novo Recife também devem participar do encontro. “A reunião é para dar início a uma negociação para rediscutir o projeto imobiliário em termos arquitetônicos e outros mais”, disse Liana Cirne.

“Queremos zerar a discussão sobre o que será feito no terreno. Não queremos modificar, adaptar o projeto nem ações mitigadoras. Queremos vincular o embargo do Iphan com a garantia de que vamos rediscutir o uso desse terreno com a participação da sociedade civil, movimentos populares, comunidades do entorno, MPPE, Judiciário e secretarias do Governo. Além disso, queremos que o projeto que vier a ser feito direcione uma porcentagem de 30% para moradia popular, com a construção de um habitacional”, afirmou o designer Cláudio Tavares, membro do Direitos Urbanos e integrante da comissão que vai participar de encontro no Ministério Público.

O terreno do Cais José Estelita é alvo de polêmica desde que o projeto Novo Recife foi anunciado. Em dezembro de 2013, a Prefeitura do Recife aprovou o projeto imobiliário para construir 12 torres ao longo do Cais, exigindo novas ações mitigadoras – tomadas para compensar os possíveis danos causados pela construção. O valor da compensação subiu de R$ 32 milhões para R$ 62,7 milhões, com a inclusão de biblioteca, túnel e um parque linear, entre outros itens. Um termo de compromisso entre a gestão municipal e Consórcio Novo Recife foi assinado na ocasião.

Relato de agressão e abertura de inquérito
O grupo de ativistas Direitos Urbanos, que se opõe ao projeto Novo Recife da maneira como está colocado, foi acompanhar a demolição, ainda na noite de quarta-feira (21), e denunciou que um de seus integrantes foi agredido. A vítima afirma que entrou no terreno do Cais José Estelita para registrar fotos e cobrar o alvará de demolição. Um segurança teria solicitado a sua retirada do terreno, que foi cumprida. Do lado de fora, quatro homens, alguns armados, teriam batido na vítima – socos, pontapés e coronhadas, além de agressão verbal e ameaça de morte.

A Polícia Civil vai instaurar inquérito para apurar a denúncia. O delegado João Brito contou ao G1 que “as lesões eram leves, mas eram visíveis as marcas no corpo da vítima”. Através de uma portaria, a Central de Plantões vai abrir inquérito e enviar para a Delegacia de Joana Bezerra, que ficarará responsável pelo caso. Além da agresão física, o delegado vai apurar questões relacionadas a ameaça de morte e crimes de danos materias, já que a vítima teve um celular quebrado. “O aparelho já foi enviado para a perícia, e a vítima também foi ao Insitituto de Medicina Legal (IML) para realizar exame de corpo e delito. O protesto era pacífico e os manifestantes apenas defendiam que as atitudes [de demolição] não eram permitidas”, contou o delegado.

João Brito informou ainda que um advogado da construtora Moura Dubeux, integrante do consórcio Novo Recife, dono do terreno, foi até a delagacia na madrugada desta quinta (22). Ele teria dito que a empresa não compactua com a violência e credita o fato a um momento isolado. A empresa também teria se comprometido a fornecer os dados para que a polícia apure a responsabilidade das agressões.

A Secretaria de Controle Urbano confirmou que o consórcio Novo Recife recebeu o alvará de demolição dos armazéns do Cais José Estelita.

Acampados
De acordo com os manifestantes acampados no Cais, as máquinas pararam o serviço por volta da meia-noite da quarta, após uma advogada do grupo Direitos Urbanos, que desde o começo do projeto pressiona a gestão municipal contra a construção, ter alegado que o alvará apresentado pelos seguranças era uma cópia do original.

O grupo recebeu denúncias de que o Cais estaria sendo demolido por volta das 22h30. Após confirmarem a informação, muitas pessoas começaram a chegar ao local para impedir. Os armazéns que foram demolidos ficam perto do Cabanga. No fundo do terreno, um grupo de cerca de cinco seguranças da empresa Klaus Costa.

Questionados sobre o motivo da demolição ter sido feita à noite e não no horário comercial e sobre o alvará, o Consórcio Novo Recife limitou-se a dizer “que as demolições iniciadas nesta quarta-feira (21) atendem a todas as exigências municipais. O Consórcio Novo Recife ressalta, ainda, que possui alvará para ação”.

Veja íntegra de nota divulgada pelo Consórcio Novo Recife, na tarde desta quinta:

O Consórcio Novo Recife esclarece que o Projeto Novo Recife, aprovado pela Prefeitura (docs. números 710561214, 710561314, 710561414 e 710561514), iniciou no dia 21 de maio de 2014, a partir das 13h, o processo de demolição de parte dos galpões localizados no terreno, com o objetivo de iniciar as ações mitigadoras acordadas com os órgãos públicos, a exemplo do parque linear com 90 mil m², a partir da área sob o Viaduto Capitão Temudo, abraçando o Cais José Estelita até o Forte das Cinco Pontas, e uma ciclovia que interliga a Via Mangue ao Bairro de São José.

O projeto atual, resultado de um longo processo de aprovação, que já destinava 40% da sua área para uso público, incluiu no seu plano de desenvolvimento uma maior participação na qualificação e revitalização de espaços públicos; no acréscimo de equipamentos de lazer, esporte e cultura, como a inclusão de quadras poliesportivas e de uma biblioteca pública no parque; na melhoria do sistema viário com a substituição do Viaduto das Cinco Pontas por um túnel; na preservação e recuperação dos galpões próximos ao Forte; e na restauração da Paróquia de São José. Essas intervenções fazem parte do conjunto de ações mitigadoras negociadas entre o Consórcio e o poder público.

É importante esclarecer que o processo de demolição obedece a todos os trâmites legais para essa ação, tendo o Consórcio responsável pela obra a posse do alvará de demolição, de número 71/00050/14, emitido pela Secretaria de Planejamento Participativo, Obras e Desenvolvimento Urbano e Ambiental da Prefeitura do Recife.

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