Manifestantes do Ocupe Estelita deixam prédio da Prefeitura do Recife
Acampamento foi desmontado após chegada de oficial de Justiça.
Reunião entre ativistas e PCR está marcada para esta quarta-feira (02).
Os manifestantes do grupo Ocupe Estelita deixaram o hall do prédio da Prefeitura do Recife, por volta das 16h desta terça-feira (1º). O mandado de reintegração de posse foi levado por um oficial de Justiça, que comunicou oficialmente o grupo sobre a decisão judicial concedida na noite da última segunda (30). Os funcionários da Prefeitura que trabalham no prédio já haviam sido dispensados no começo da tarde.
As cerca de 50 pessoas que estavam acampadas deixaram o local e passaram a caminhar pela avenida Cais do Apolo. O grupo seguiu em passeata até o acampamento que está montado sob o Viaduto Capitão Temudo, nas proximidades do Cais José Estelita. O grupo está ocupando o espaço desde que a reintegração de posse do terreno do cais foi cumprida.
Uma reunião entre representantes do Ocupe Estelita e da Prefeitura do Recife está marcada para esta quarta-feira, às 15h. O prefeito Geraldo Julio vai participar, junto com os secretários Jayme Asfora (Juventude) e Antônio Alexandre (Planejamento Urbano). Representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/PE), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), Instituto de Arquitetura do Brasil (IAB), Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Pernambuco (Crea) e Observatório do Recife também estarão presentes.
De acordo com Carla Guareschi, do Centro Popular de Direitos Humanos, não foi assinado o termo que firmava os pontos acordados na reunião realizada durante toda a noite da segunda-feira, entre representantes do Ocupe Estelita e o secretário de Juventude e Qualificação Profissional do Recife, Jayme Asfora. A ideia do grupo era formalizar esses pontos junto a representantes da Prefeitura. “Estamos saindo não porque queremos, nem porque a negociação evoluiu, mas porque é uma ordem judicial. Estamos traumatizados da outra reintegração e não queremos que aquela violência se repita”, comentou.
Entre os pontos incluídos no termo estão a garantia da presença do movimento Ocupe Estelita em todas as reuniões futuras referentes ao projeto Novo Recife; que essas reuniões contem também com a presença do Ministério Público de Pernambuco e do Ministério Público Federal; que os procedimentos para revisão do projeto, aprovados sem a anuência do Ocupe Estelita, sejam revogados; que as negociações passem a contar com representantes do Fórum Estadual de Reforma Urbana e Centro Dom Hélder Câmara – CENDHEC. Veja a íntegra do termo ao final desta reportagem.
“Temos disposição de dialogar, sempre fomos o lado que que esteve aberto à negociação. Mas chegamos a um ponto em que precisamos que tudo que seja decidido em reuniões seja dado por escrito. Nós baixamos e muito as pautas que comunicamos ontem, com objetivo de chegar ao acordo. Apresentamos esse termo, que tinha o que foi discutido numa reunião que durou cinco horas com o secretário Jayme Asfora. Para nossa frustração, mas não por nossa surpresa, o prefeito nao assinou”, disse a professora da UFPE Liana Cirne Lins, integrante do grupo Direitos Urbanos.
A Prefeitura informou, através de nota, que houve “diversas iniciativas de negociação para desocupação do térreo do edifício sede, por parte de integrantes do movimento Ocupe Estelita. Este esforço envolveu representantes de sete entidades e instituições reunidas na Prefeitura e de secretarias municipais”. O texto afirma também que “os representantes dos ocupantes solicitaram o prazo até as 14h de hoje, terça-feira, para desocupação pacífica sem a necessidade de execução da ordem judicial expedida, por volta das 20h de ontem”.
O secretário de Desenvolvimento e Planejamento Urbano, Antônio Alexandre, informou que a pauta do movimento não foi aceita porque a proposta “limita a negociação e obstrui um debate amplo”. Ele acrescentou que a Prefeitura não concorda com a mediação presidida pelo Ministério Público, já que este é autor de ações, e também disconcorda da participação do movimento em todas as reuniões, porque acredita que as partes precisam ser ouvidas separadamente.
Entenda a polêmica
Os integrantes do Ocupe Estelita desaprovam o projeto Novo Recife, que prevê a construção de 12 torres residenciais e comerciais, com altura variando entre 20 e 41 andares, no terreno do Cais José Estelita, que fica na zona central da capital, que tem uma área de 10 hectares (aproximadamente, equivalente a 10 campos de futebol).
O terreno pertencia ao espólio da Rede Ferroviária Federal e foi adquirido em leilão realizado em 2008, pelo Consórcio Novo Recife, que é formado pelas empresas Ara Empreendimentos, GL Empreendimentos, Moura Dubeux Engenharia e Queiroz Galvão Desenvolvimento Imobiliário.
Audiência pública
A edição desta terça-feira do Diário Oficial do Recife traz a convocação para a audiência pública que vai discutir o projeto Novo Recife. Por meio da Secretaria de Desenvolvimento e Planejamento Urbano, a primeira discussão sobre as diretrizes urbanísticas para a área ficou marcada para o dia 17 de julho, das 14h às 17h, no auditório da Faculdade Franssinetti do Recife (Fafire), no bairro da Boa Vista, Centro da cidade.
Em entrevista coletiva na tarde de segunda (30), o secretário Antônio Alexandre já havia adiantado a publicação da convocação desta terça. A previsão é de que, até o dia 17 de julho, as duas principais partes envolvidas na polêmica em torno do Cais José Estelita – Consórcio Novo Recife e movimento Ocupe Estelita – sejam ouvidas na Prefeitura, formulando as propostas iniciais. De acordo com o secretário, o objetivo é já levar um documento com as primeiras ideias para a audiência e, assim, estimular a discussão.
As diretrizes urbanísticas a serem discutidas podem estabelecer, por exemplo, o gabarito (quantidade de andares) dos edifícios, a disposição de imóveis comerciais e residenciais no terreno, a quantidade de área verde e disposição de terrenos para moradia popular.
A convocação dessa audiência estava prevista no documento elaborado na Prefeitura do Recife, no dia 16 de junho, um dia antes da ação da polícia para reintegrar o terreno do Cais, onde os manifestantes estavam acampados, ao grupo de construtoras. Como primeiro passo da negociação, estava a submissão da proposta de procedimentos aos representantes do Ocupe, Novo Recife e Ministérios Públicos Federal (MPF) e de Pernambuco (MPPE). De acordo com a Prefeitura do Recife, todos receberam o documento, mas apenas o Consórcio respondeu confirmando que aceitava a proposta realizada.
Ocupação no Cais José Estelita
A área do Cais José Estelita foi ocupada em 21 de maio por manifestantes contrários ao projeto Novo Recife, plano imobiliário de um grupo de construtoras que prevê a construção de torres residenciais e comerciais num terreno de 10 hectares, no Centro Histórico do Recife. Eles pedem a nulidade do processo administrativo que aprovou o projeto, que hoje é objeto de ações judiciais questionando sua legalidade.
No dia 3 de junho, a Prefeitura do Recife anunciou a suspensão da licença que permitia a demolição de galpões da área do cais. No dia 5, o engenheiro Eduardo Moura, representante da Moura Dubeux Engenharia, afirmou que o Consórcio Novo Recife concorda em produzir um novo projeto para o terreno.
O Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) concedeu a reintegração de posse da área, atendendo a um pedido feito por advogados do Consórcio Novo Recife. O DU e o Ministério Público recorreram da decisão, que foi analisada pela Justiça estadual no dia 18 de junho e considerada legal. A reintegração de posse foi cumprida no dia 17 de junho, após ação violenta da PM no terreno. Desde então, a ocupação acontece sob o viaduto Capitão Temudo, nas proximidades do Cais, no Centro.
Veja comunicado oficial divulgado pela Prefeitura do Recife nesta terça (01/07):
A Prefeitura do Recife prestou esclarecimentos, em nota oficial publicada hoje, dia 1º de julho, sobre as diversas iniciativas de negociação para desocupação do térreo do edifício sede, por parte de integrantes do Movimento Ocupe Estelita. Este esforço envolveu representantes de sete entidades e instituições reunidas na Prefeitura e de secretarias municipais.
No final da noite de ontem, os representantes dos ocupantes solicitaram o prazo até as 14 horas de hoje, terça-feira, para desocupação pacífica sem a necessidade de execução da ordem judicial expedida, por volta das 20h de ontem.
Durante toda a manhã desta terça-feira, os secretários municipais permaneceram à disposição e receberam os representantes dos ocupantes, sem obter resposta positiva. Findo o prazo acordado, a Prefeitura do Recife solicitou ao Ministério Público Estadual que um representante acompanhe o cumprimento da ordem judicial que pode ser executada a qualquer momento.
A Prefeitura do Recife reafirma seu compromisso em realizar a reunião com os representantes do Movimento Ocupe Estelita amanhã, às 15h, se a desocupação pacífica for realizada imediatamente.
Veja íntegra do termo proposto pelo movimento Ocupe Estelita:
TERMO DE AJUSTE PARA RETOMADA DO DIÁLOGO
Considerando que nós, ativistas do Movimento Ocupe Estelita, ocupamos pacificamente o hall do prédio da Prefeitura da Cidade do Recife, interagindo amistosamente com todos os cidadãos que até lá se dirigiram, inclusive auxiliando pessoas com deficiência;
Considerando que a única reunião com o Movimento Ocupe Estelita ocorreu em data de 02/06/2014, data em que a negociação se iniciou;
Considerando que a negociação para discussão do projeto de revitalização da área do Cais José Estelita é estratégica, pois tanto pode promover um verdadeiro desenvolvimento sustentável da cidade como um todo e dos bairros do entorno ou, ao contrário, agravar ainda mais os problemas do Recife, pressionando áreas vizinhas e radicalizando desigualdades;
Considerando a necessidade de que essa discussão seja refeita com participação plena da sociedade civil, pois todos serão atingidos pelas decisões que vierem a ser tomadas;
Considerando que o Movimento Ocupe Estelita, ao ocupar o Cais em 21/05/2014, impediu a demolição dos galpões que foram preservados por três decisões: do IPHAN, da Justiça Federal e da Prefeitura;
Considerando que graças à ocupação, deu-se início à negociação em curso;
Considerando a fala do Vice-Prefeito Luciano Siqueira na reunião de 02/06/2014, afirmando a necessidade de que a discussão acerca da revitalização do Cais José Estelita fosse pautada também pelos temas da reforma urbana e da luta pela moradia;
Considerando que foram ajustadas duas reuniões sem a participação do Movimento Ocupe Estelita – em 05 e 06 de junho, com o Consórcio Novo Recife e com o Ministério Público, respectivamente -, após o que o Movimento voltaria a participar da rodada de negociação;
Considerando que foram realizadas duas reuniões sem o Movimento Ocupe Estelita fora dos termos ajustados, uma das quais após a ação brutal do Governo de Pernambuco, através da sua Polícia Militar, com o propósito principal de reprimir politicamente o Movimento;
Considerando que a negociação completou um mês com apenas uma reunião com o Movimento Ocupe Estelita;
Considerando que uma discussão crucial para o desenvolvimento da cidade não pode parar e nem tampouco pode o Movimento ser desprezado da rodada de negociação que iniciou graças a ele;
Considerando que diante de todos os fatores anteriores, o Movimento Ocupe Estelita se viu forçado a pressionar a Prefeitura para retomada da negociação;
Considerando que o Movimento Ocupe Estelita sempre se dispôs ao cumprimento pacífico das decisões judiciais, tendo sido cerceado dessa possibilidade pelos oficiais de justiça que promoveram a reintegração de posse do propriedade do Consórcio Novo Recife no dia 17/06/2014; PROPÕE O MOVIMENTO:
1) Retomada imediata da rodada de negociação com a participação do Movimento Ocupe Estelita, designando-se reunião com o Prefeito do Recife para data de amanhã, 02/07/2014;
2) Que todas as reuniões ocorram com a presença do Movimento Ocupe Estelita, assegurando-se no mínimo a presença de comissão composta por seis membros do Movimento;
3) Que todas as reuniões ocorram com a presença do Ministério Público de Pernambuco e do Ministério Público Federal;
4) Que os procedimentos para revisão do projeto, aprovados ontem sem a anuência do Movimento Ocupe Estelita, sejam revogados e cancelados seus encaminhamentos;
5) Que novos procedimentos para revisão do projeto sejam construídos com o Movimento Ocupe Estelita e o Ministério Público, inclusive;
6) Que seja restaurada a composição da mesa de negociação com participação das entidades ligadas ao debate acerca da reforma urbana e da luta pela moradia, quais sejam, Fórum Estadual de Reforma Urbana – FERU e Centro Dom Hélder Câmara – CENDHEC;
7) Que todas as reuniões sejam reduzidas a termo, garantindo-se por escrito os ajustes firmados. DIANTE DISSO e tendo em vista ordem judicial expedida em data de ontem, assegura a retirada pacífica do acampamento do hall do Prédio da Prefeitura do Recife que ora ocupa, no exato momento em que for intimada para cumprimento da decisão judicial.
Recife, 1º de julho de 2014
Movimento Ocupe Estelita