Policiais extorquiam dinheiro de traficantes, aponta polícia de SP
Operação do Deic começou em fevereiro e terminou com 40 detidos.
Denúncias contra agentes serão encaminhadas para corregedorias.
Investigação do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) aponta que policiais civis e militares extorquem dinheiro de traficantes em São Paulo. A descoberta é um dos resultados de operação realizada desde fevereiro contra facção criminosa que age a partir dos presídios de São Paulo.
Entre sábado e segunda-feira (14), a polícia cumpriu mandados de busca e de prisão contra suspeitos de envolvimento com o crime organizado na Grande São Paulo e no interior do estado.
A operação terminou com a prisão de 40 suspeitos de tráfico, apreensão de carros de luxo, drogas e dinheiro. Não há nenhum policial entre os detidos na ação, batizada de “Bate-bola” em referência à maneira como são chamadas as trocas de mensagens entre os chefes da facção. A extorsão praticada pelos policiais será agora avaliada pela corregedoria.
Segundo o diretor do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), Wagner Giudice, a apuração indica que policiais não facilitavam a operação da quadrilha, mas recolhiam dinheiro dos criminosos ao passar nos pontos de venda de droga.
“Eles não fazem parte do esquema. O policial, do que coletamos, passa na biqueira e arrecada o dinheiro do momento. É muito mais uma situação de concussão, ou extorsão cometida por funcionário público, do que outra coisa. Não sabemos ainda quantos são, vai demandar outras quebras de sigilo”, afirma Giudice.
O secretário da Segurança Pública, Fernando Grella Vieira, afirmou que recebeu as denúncias e que irá repassar às Corregedorias da PM e da Polícia Civil.
“Nem uma nem outra tiveram, até agora, conhecimento de prova. Estarei fazendo o encaminhamento [das denúncias] agora à tarde”, disse Grella.
Balanço divulgado pela Secretaria da Segurança Pública (SSP) aponta que foram apreendidos R$ 120.973 em espécie, 102 kg de cocaína, 40 kg de maconha, 300 frascos lança-perfume e munições. “Foi um grande golpe na organização criminosa. Não resolve, mas é um resultado altamente positivo”, disse Grella.
Ao todo, 31 carros, sendo cinco de luxo, e duas motos foram apreendidos na ação. Quatro veículos foram levados na segunda para o Departamento de Investigações Criminais (Deic). Segundo as investigações, eles pertencem a um dos presos. Um dos carros está avaliado em cerca de R$ 400 mil.
Uma das lideranças financeiras da facção também foi presa na operação “Bate-bola”. Amarildo Ribeiro da Silva, conhecido como Julio, gerenciava o faturamento dos criminosos, que girava em R$ 7 milhões mensais. Ele também era responsável pela liberação de altas quantias para a compra de droga no atacado fora do país. Foram bloqueadas três contas bancárias que eram utilizadas por Amarildo.
Armas apreendidas
A polícia também encontrou com o grupo um fuzil, uma submetralhadora, quatro pistolas, celulares, computadores e documentos com informações sobre a facção.
Os dados apontam que a droga vinha da Bolívia e do Paraguai e era levada para um esconderijo em Cidade Tiradentes, no extremo da Zona Leste. De lá, a carga era transportada a um centro de distribuição na Zona Sul, onde os traficantes se abasteciam para revendê-la em pontos espalhados pela cidade.
Segundo a polícia, a organização criminosa estipulava metas de vendas para cada traficante e chegava a movimentar R$ 5 milhões por mês. Boa parte dos documentos apreendidos estava com um preso que é considerado uma espécie de diretor operacional da quadrilha e um elo importante com o comando da facção nos presídios. Os registros mostram também indícios de pagamento de propina a policiais civis e militares.
A Interpol foi acionada para prender outros dois integrantes da quadrilha que estão fora do país. Um no Paraguai e outro nos EUA. As prisões ocorreram na Zona Leste e Zona Sul da capital e nas cidades de Suzano e Guarulhos, na Grande São Paulo.
Os alvos são traficantes, assaltantes e contadores ligados ao crime organizado. A polícia tenta identificar os bens para pedir o bloqueio deles pela Justiça. As investigações apontam que o dinheiro do tráfico é investido em postos de gasolina, supermercados, fazendas e lojas de carro. Uma concessionária era utilizada para a lavagem de dinheiro da organização criminosa.
Marcola continua como chefe
Segundo o delegado Rui Ferraz Fontes, do Deic, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, ainda é o chefe máximo da organização. “A conclusão que se chega a partir dos dados obtidos é que sim.” Além de Marcola, são investigados outros supostos líderes, como Rogério Geremias de Simone, o GG do Mangue, e Edilson Borges Nogueira, o Birosca. Os dois estão presos em Presidente Venceslau.
A investigação identificou que Marcola agora usa o apelido de “Russo” para despistar a polícia. Cerca de 40 kg de cocaína – mais de um terço do total apreendido – era de propriedade do chefe máximo da facção. A arrecadação da venda seria revertida integralmente para Marcola.
Também são investigados Fabiano Alves Souza, o Paca, que está foragido no Paraguai, e Wilson José Lima de Oliveira, que se agregou nos Estados Unidos a um grupo desconhecido pela polícia brasileira.
Segundo o Deic, Oliveira mantém lá pontos próprios de venda da droga, e os outros da facção. “Ele está vivendo do lucro da venda da cocaína em São Paulo, lá nos EUA, abrigado por alguém que nós desconhecemos. As informações já foram passadas para a polícia dos EUA, e talvez tenhamos essa resposta em breve”, disse Fontes.
Sobre a atuação de Marcola de dentro do presidio, o promotor Lafaiete Ramos disse que o problema é de ordem legal. “Nós não temos um instrumento legal, eficiente, para estancar isso. Não é nem responsabilidade de chefe de estado.
Isso está na mão do judiciário”, defendeu.
“O RDD é uma medida que será decidida pelo poder judiciário. O MP batalhará por isso”, completou Ramos, citando o temido Regime Disciplinar Diferenciado.
Quando o preso é colocado no RDD, fica dentro de uma cela individual 22 horas por dia, sem direito a noticiário, visitas íntimas e com apenas duas horas diárias de banho de sol. Marcola já esteve internado outras vezes no isolamento.
Sobre a mudança de Marcola para o RDD, o secretário da Segurança disse que pretende se reunir com representantes da pasta da Administração Penitenciária (SAP) para fazer o pedido à Justiça. “Estou aguardando a vinda de documentos para nós analisarmos essas provas [contra Marcola].”