Projeto de lei que cria cotas para negros em concursos fica para 2014

Câmara fica em recesso até fevereiro; proposta tramita em comissões.

Se passar pela Comissão de Justiça, será levada para votação em plenário.

Apesar de ter sido enviado à Câmara em regime de urgência, o projeto de lei que reserva para negros 20% das vagas nos concursos públicos da administração federal só deverá ser votado no ano que vem.

Os deputados entraram em recesso na sexta (20), antes que terminassem os 45 dias de prazo para análise de projetos em regime de urgência, que, no caso das cotas, venceria no próximo domingo (22).

A Câmara só retoma os trabalhos em fevereiro. Porém, para ser votada no Plenário, a proposta precisa passar por mais uma comissão, a de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), que recebeu o projeto no início de novembro, junto com outras duas comissões que já deram sua aprovação à reserva de vagas.

Se aprovado pelos deputados, o projeto de lei do governo federal seguirá para apreciação dos senadores. Tanto a Câmara quanto o Senado poderão fazer modificações no texto.

O objetivo da Secretaria de Políticas de Promoção Igualdade Racial (Seppir), ligada à Presidência da República, é que o projeto seja sancionado no próximo dia 21 de março, data que marca o Dia Internacional Contra a Discriminação Racial e o aniversário de 11 anos da secretaria.

O que é o projeto
A proposta do governo federal visa concursos da esfera federal cujos editais tenham sido publicados após a lei entrar em vigor. Para seleções que foram abertas antes disso, nada muda.

A reserva de vagas valeria tanto no âmbito dos ministérios quanto para autarquias, agências reguladoras, fundações de direito público, empresas públicas e sociedades de economia mista controladas pela União, como Petrobrás, Caixa Econômica Federal, Correios e Banco do Brasil.

Os candidatos negros podem concorrer às vagas da cota racial e às destinadas à ampla concorrência. Os negros que tiverem nota suficiente para aprovação dentro do número de vagas da ampla concorrência não tirarão a vaga do sistema de cotas.

“Esse projeto na realidade é a consequência de um processo de evolução das políticas publicas de promoção da igualdade racial no Brasil”, afirma Giovanni Harvey, secretário-executivo da Seppir. A secretaria propôs o projeto, que foi discutido com o Ministério do Planejamento e também com o movimento social negro.

Segundo o projeto, a população negra representa 50,74% da população total, mas no Poder Executivo federal, essa representação cai para 30% ou 158.145, considerando que 82% dos 519.369 dos servidores possuem a informação de raça/cor registrada no sistema.

“O projeto é um estímulo para que todas as etnias participem do serviço público fazendo com que toda a sociedade brasileira se sinta representada”, ressalta Harvey.

Autodeclaração
O projeto de lei federal também prevê que a autodeclaração será o critério para permitir que um candidato participe do processo seletivo pela reserva de vagas. O mesmo procedimento já é utilizado nos quatro estados que têm leis próprias de cotas raciais: Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

Apenas no Mato Grosso do Sul é feita também uma entrevista para verificar cor da pele e características como tipo de cabelo, formato da boca e nariz. O governo do Rio Grande do Sul estuda criar uma banca de verificação.

O projeto federal não fala em nenhum tipo de verificação prévia de quem se autodeclarar negro. Segundo o texto, na hipótese de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso. Se já tiver sido nomeado, ele responderá por procedimento administrativo e poderá ter a admissão anulada.

Paulo César Medeiros, subsecretário de carreiras, remuneração e desenvolvimento de Pessoas da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão do Rio de Janeiro, diz que não existe uma “fórmula ou definição exata” para determinar se o candidato se encaixa na política de cotas. “Não existem estudos no Brasil que determinem se a pessoa é negra, branca ou parda. O próprio Censo é pela autodeclaração”, ressalta.

Cota nos estados
O projeto federal prevê uma reserva maior do que já é praticada nos estados. No Rio Grande do Sul, a lei prevê a reserva de 16% das vagas para negros, pardos e indígenas. No Paraná são 10% para negros, no Mato Grosso do Sul são 10% para negros e 3% para índios, e no Rio de Janeiro são 20% para negros e índios.

O estado de São Paulo apresentou no dia 6 de dezembro um projeto de lei que pretende instituir uma pontuação extra para negros, pardos e índios em concursos públicos estaduais. A meta é que cada órgão do estado tenha 35% de servidores negros e pardos e 0,19% de indígenas em 5 anos. A proposta foi enviada para a Assembleia Legislativa, mas não há previsão de votação. O projeto também prevê o uso da autodeclaração como critério de seleção.

A prefeitura de São Paulo sancionou no dia 24 de dezembro um projeto de lei que criou cotas para negros em concursos da administração municipal. Segundo o texto, 20% das vagas serão reservadas para negros e afrodescendentes. A autodeclaração será utilizada para a participação dos candidatos.

Negros no serviço público
Segundo a Secretaria de Planejamento do Rio de Janeiro, o estado tem 368.361 servidores ativos e inativos. Desse total, há 14.474 servidores negros ativos e 8.210 servidores negros aposentados. No entanto, o número dos que não informaram a cor da pele é de 46.905 ativos e 16.212 inativos. A secretaria ressaltou que os dados são declarados pelos servidores e não são obrigatórios e que por isso, não exprimem a totalidade dos servidores.

No Rio de Janeiro, 2.200 candidatos negros e índios foram ingressaram no serviço público por meio da cota racial desde 2011. Foram realizados cerca de 15 concursos públicos em diversas áreas de atuação governamental, como gestores, executivos públicos, professores, policiais civis e militares, entre outros. No total, mais de 10.800 vagas foram abertas, segundo a Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão.

No Paraná existem 3.571 servidores estatutários registrados no sistema de recursos humanos como de raça negra. A lei estadual é de 2003.

No Rio Grande do Sul, as estatísticas registram 4.598 servidores negros.

Trata-se de uma amostragem, pois a atualização do cadastro depende da declaração dos servidores. E essa informação ainda não representa o efeito do sistema de cotas raciais, considerando que poucas nomeações ocorreram desde a vigência da lei, há 11 meses. No concurso do magistério, o primeiro com a lei em vigor e resultados oficiais já divulgados, 626 cotistas foram aprovados em um universo de mais de 13 mil aprovados, número abaixo do determinado pela nova legislação.

No Mato Grosso do Sul, a Secretaria de Administração não informou o total de servidores negros ativos, mas disse que desde a criação do regime de cotas foram nomeados 57 que se declararam negros e dez que se declararam índios.

Do G1

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